Toda história, no fim das contas, é sobre alguma coisa. Uma guerra épica de gerações, uma noite no centro de uma metrópole, o intervalo de 30 segundos entre a luz verde e a luz vermelha de um semáforo… grande ou pequena, uma história geralmente pode ser definida num tema.
Não precisa ser apenas uma coisa, claro, mas ter um foco central ajuda no desenvolvimento, servindo como um guia. Enquanto a história é criada, vai ocorrer de você perder a linha de pensamento focando em algum detalhe; quando você começa definindo o ponto principal que sua narrativa terá desde o começo, você cria um porto seguro pra onde seu raciocínio pode voltar enquanto você cria a história e, depois de terminada, quem ver sua história pode ir para entendê-la melhor.
Esse foco narrativo pode mudar durante o desenvolvimento também, claro. Dependendo do tamanho da história você pode rever se manter esse foco ainda faz sentido, ou até decidir que o foco narrativo troca dependendo dos trechos. A gente tá aqui pra ajudar, não prender, então fique livre pra brincar com tudo!
Aqui, estabelecer como o mundo é e funciona é o principal e já se propõe uma abordagem que segue várias histórias diferentes. Game of Thrones carrega um pouco disso, por exemplo: por conveniência, ela tem seu elenco principal, mas a série de livros e filmes pinta mais a história do mundo e o conflito mitológico de Westeros, e a história particular de cada um ocorre de existir ali no meio.
"Entre São Cristóvão e Castelo, o berço da Comunicação no Brasil, há os estúdios da Rádio Trópico. Em outros tempos era uma das maiores emissoras do país. Infelizmente, muitos de seus astros foram captados por outra estação no mesmo período em que TVs se tornavam mais acessíveis; seu alcance nos últimos 40 anos diminuiu ao ponto de ela apenas atender à Região Metropolitana do Rio. Mesmo assim, ela se manteve popular entre os trabalhadores da área do entretenimento; sua relativa proximidade de centros culturais e outras emissoras de rádio e TV a beneficiou com uma audiência cativa e criativa. Agora sua equipe tenta crescer novamente para impedir que sua história seja apagada."
O mundo é vago, e os poucos detalhes que são conhecidos são os que entram em contato com os personagens escolhidos.
A série de livros de Dan Brown seguindo Robert Langdon apresentam um bom exemplo deste estilo. Não temos muita noção das sociedades que existem na narrativa, exceto quando elas oferecem detalhes essenciais para as investigações de Langdon.
Um trio de amigas, após uma situação inusitada, se junta para começar um grupo musical. As três tem personalidades e problemas distintos, e nos percalços da carreira musical elas vão crescendo como artistas e como pessoas, aprendendo a caminhar pelo mundo e a criar seu próprio espaço.
O interessante aqui não é nem o mundo, nem os personagens em si, mas sim algo que interage com ambos. Mais comum em histórias saídas de linhas de brinquedo. Se popularizou após o sucesso de Pokémon, que também é o maior exemplar. O mundo de Pokémon existe pra ser apenas onde os Pokémons existem, e a existência deles e as interações que podem ser tidas com eles estabelecem o tom narrativo. Esse elemento não precisa ser concreto; narrativas em torno de um sistema mágico/sobrenatural se encaixam aqui.
"Há alguns meses, a Rádio Trópico iniciou um novo programa, “DJ por Um Dia”, uma chance para indivíduos com grandes ambições para o estrelato cuidarem do horário vespertino às quintas-feiras. Esse programa se torna popular entre jovens e jovens adultos, e logo vira um celeiro para novos talentos. Com o sucesso do programa, começa um circuito nacional de concursos musicais onde os melhores tem a chance de viajar e ser conhecido pelo Brasil inteiro."
Você acha esse tipo de foco narrativo atualmente com franquias japonesas geralmente. Nesse estilo de narrativa as próprias ferramentas narrativas ditam como a história será. Arcos narrativos, progressões de base, arquétipos… É necessário um grande domínio destas ferramentas para que as narrativas tenham sucesso. Traços de narrativas focadas em estrutura são achados facilmente nas novelas: Manoel Carlos, Aguinaldo Silva e Glória Perez são reconhecidos pelos elementos narrativos estruturais que são a marca registrada nas novelas que fazem.
As meninas, só de vista, tem aspectos relativamente arquetípicos, especialmente notáveis na maneira como elas interagem umas com as outras, da heroína relutante, à cheia de energia, normalmente vista em séries japonesas como a protagonista. No entanto, é por meio dos arcos narrativos por quais elas passam que elas conseguem evoluir para além destas curtas descrições e se mostrarem como personagens mais pluridimensionais. Algumas descrições desses arcos narrativos podem ser encontradas ali em cima, dentro de PERSONAGENS.
Determinar o tipo de narrador que direciona e comanda a história do texto é tão importante quanto definir a base da narrativa. Esse elemento é um fator primordial presente em todos os tipos de narrativas, sejam elas escritas ou visuais. As diferenças entre os estilos de narração podem determinar o tom da história, a importância do narrador em seus confins e o rumo que a história pode tomar dependendo do tipo de narração empregada. Geralmente se divide o estilo de narração em três categorias:
Para os exemplos abaixo, vamos imaginar como essa cena aqui seria escrita nos diferentes estilos.
O narrador personagem é presente de corpo e mente na história sendo contada como personagem principal ou coadjuvante. O narrador comenta os eventos partindo de sua perspectiva. Tipicamente é encontrado em histórias onde é necessário que o estado mental e o ponto de vista de um dos personagens esteja claro e evidente para todos. Quase todo o texto descritivo vai estar em primeira pessoa.
É o estilo de narração que permite com mais tranquilidade o narrador inconfiável, aquele que distorce os fatos para apresentar a história que quer e não a que acontece.
"OK, Adriana. Fica calma que deve dar para resolver tudo. Esquece essa pilha de nervos, cabeça pra cima e vamos lá. É só entrar lá, falar que foi um engano, e sair... esse lugar é maior do que eu esperava."
Pensa num Era Uma Vez clássico. Esse tipo de narrador é o clássico trovador contador de histórias, que conta os acontecimentos quase que exclusivamente em terceira pessoa, como se estivesse lendo um livro ou se lembrando de acontecimentos nos quais ele não se encontra como “personagem”. Como ele está por fora da trama, pode dar abertura para detalhes que passariam despercebidos pelo narrador personagem.
Se você gosta de quebrar a quarta parede e dialogar direto com seu público, esse estilo de narração é bem bom para isso. Nada melhor do que ter alguém para zoar contigo, e ser esse alguém nunca faz mal.
"Adriana contemplava a entrada da rádio fixamente, durante vários minutos. Completamente estática em frente ao prédio enquanto pessoas passavam por ela. Do jeito que suava frio, parecia que surgiria uma poça nos seus pés e os pombos pousariam em cima dela, como se ela fosse uma fonte."
Narradores oniscientes possuem conhecimento de todos os fatos, emoções, acontecimentos, personagens e períodos de tempo da história, mas não participam na história de maneira alguma, por isso são chamados “oniscientes”. Sabe, por que eles sabem de tudo. É um estilo de narração que não se prende a uma certa linguagem, então consegue ser bem flexível na hora de criar, e também pode guiar a navegação por uma história inicialmente confusa.
Mas também é preciso ter um cuidado para não abusar da onisciência e acabar tirando a graça de alguns mistérios da trama. Ou você pode deixar tudo às claras e fazer a forma que os personagens que não são oniscientes descobrem o que o público já sabe ser a graça da trama.
Como veem, possibilidades infinitas.
"Adriana não conseguia mais se mover. Estar em frente a estação de rádio que escutava desde criança com os pais a enchia de sentimentos conflitantes. Alegria, medo e apreensão se misturavam. Ela criava coragem para entrar e desmarcar tudo ao mesmo tempo que se desmotivava a desistir da oportunidade de participar do programa. Enquanto isso, Claudia, na esquina, observava a curiosa cena de Adriana parada em frente à Rádio Trópico como se apenas houvessem os dois no espaço."